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Este blog nunca se irá encontrar escrito ao abrigo do (des)Acordo Ortográfico de 1990!

domingo, 31 de janeiro de 2016

Perfura


Não me importo que me não reconheçam. 
Eu nunca fui o que soube que não era, 
Sabendo ainda sempre ser o que foram 
Aquelas coisas que me faziam ser. 
Aquilo que doutros em mim fui, eu jamais quisera 
E de tudo aquilo que propunham não ser, 
Sempre o fui, é certo, sem causar atrito. 
Sempre tudo isso achei bonito 
E de tudo fiz exacerbada quimera 
Por ser como um não tudo daquilo que era.

E agora, sou das terras em rasgos abertas, 
Por onde corro como solta ribanceira, 
Às pedras de outros que foram ofertas 
Para de mim serem fronteira, 
As uso como caminho onde corro solto! 
E desse caminho que desconheço, não volto 
A ser corpo ou qualquer outro estado.  
Sou tudo, em exacto momento mas, não parado! 

E agora que caminho sem obstáculo ou paragem, 
Desfaço as areias que não me movem a parte alguma 
Senão para onde as consequências agem
Como prémios exímios da coragem, em suma,
Dos actos que por cobardia quis desfeitos na proa
Do navio que abandonei ao largo da foz.
Que o que fiz, até então, de intenção boa,
À vista de todos foi de atitude atroz.

Desconheço as formas com que desenhavam,
Nas praias do que todos fomos, em união furtiva,
Com estacas cravadas, enquanto sangravam
E tingiam o nada com o fumo que esquiva
Dos corpos transcendentes que não haviam.
Se éramos todos sonhos, tal forma desconhecia.
Sei apenas que respirámos das marés que vinham e iam
Por entre as ternas auroras que eu próprio fornecia.

E por fim, despertámos em desunião composta
Por entre o pestanejar insistente do acordar,
Como a frágil água nascente, perfura disposta
As pedras que me foram dadas para murar,
Na ideia de se tornar mais forte, após tanto caminho,
Desvios e vales por entre cada imponente serra,
E já rio saber chegar à foz, quase que sozinho,
E reencontrar o sentido de ser mar para a Terra.

Bruno Torrão

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Dia traçado


Primeiro veio a noite, atrasada e escura de si,
Para nos esconder das caras que estranhámos
À partida, na nossa chegada, vi-me eu em ti
E nas horas que os braços entrançámos,
Traçámos conversas que só a dois fazem jus.
Fomos como copos trazidos em vinque de luz

Veio então a madrugada já criança
E os nossos corpos traziam luz de sobra
No enleio das músicas fizemos a dança
Que a alma insana aos corpos cobra.
Traçámos carícias que só a dois fazem jus.
Fomos como copos plenos de luz.

Chegou mais cedo a primeira alvorada
E a manhã submersa em névoa densa,
Com timidez da pressa, envergonhada,
De quem se desnuda de energia intensa.
Traçámos p’los corpos que só a dois fazem jus. 
Fomos como copos emergidos na luz.

E tardámos na tarde invernosa e de chuva
A encontrar os nós górdios que nós em nós atámos.
Pisámos tudo o que se pisa como se pisa a uva
Até de vinho encher os copos com que brindámos,
E como se traçássemos nos copos o vinho em sumo
Partimo-nos dos copos até se fazerem fumo.